22 julho, 2005

Nós Fazemos Teatro

Tenho duas coisas a dizer. Primeiro:
Acho um grande absurdo os 16 milhões investidos no espetáculo O Fantasma da Ópera. Nada contra as grandes produções, a minha indignação se dá pelo simples fato de que esse dinheiro - os 16 milhões - é público. Sim, 16 milhões do nosso rico dinheirinho pago através de impostos investidos num espetáculo voltado para as elites, onde se paga 100 reais por um ingresso, para uma pura reprodução da Broadway, num tema pra lá de manjado como O Fantasma da Ópera, onde não estimula em nada a reflexão, não difunde nada da nossa cultura, e ainda por cima, desvaloriza o artista brasileiro. É mero entretenimento, não é teatro. E assim, vemos os nossos bons grupos de teatro se matando por um lugar ao sol, e nunca sobra grana pra eles. Por que? Vai tomar no cu, Gilberto Gil, por aprovar uma coisa dessas.

Segundo:
Acho um verdadeiro saco toda vez em que um jornalista aparece pra assitir o espetáculo, e o diretor vem com a pérola: "olha, o fulano de tal jornal vem aí, ele é crítico, portanto, caprichem hoje"... opa, opa, peraí... não é porque é fulano ou sicrano que vc tem que caprichar. O capricho tem que ser em todas as ocasiões, para todo e qualquer tipo de público que venha assistir o espetáculo. Temos que fazer bem porque queremos fazer bem, e não porque tem algum "crítico" de jornal, porque todas as pessoas, independente do cargo que ocupam, merecem assistir um bom espetáculo. Lembrando que essa "crítica" de jornal também é muito relativa, também divulgam muita porcaria por aí com as tais cinco estrelas. Aí depois não reclame se der merda, pois trablahar com paranóia não dá. Não joguemos a espontaneidade no lixo, por favor.

E pra fazer um paralelo sobre as minhas reclamações, exponho aqui um texto ótimo para a ocasião.

NÓS FAZEMOS TEATRO

Contra a ignorância, o terror, a falta de educação, a propaganda de promessas, o conforto moral, a ordem acima do progresso, a fome, a falta de dentes, a falta de amores, o obscurantismo... nós fazemos teatro.

Fazemos teatro para dar sentido às potencialidades, pra ocupar o tempo, pra desatolar o coração, pra provocar instintos, pra fertilizar razões, por uns trocados, por uma boa bisca, porque é fundamental e é inútil.

Pra subir na vida, pra cair de quatro, pra se enganar e se conhecer... contra a experiência insatisfatória; contra a natureza, se for o caso, nós fazemos teatro.

Fazemos teatro pra não nos tornarmos ainda pior do que somos.

Pra julgar publicamente os grandes massacres do espírito.

Pra viabilizar a esperança humana, esta serpente...

Nós fazemos teatro de manhã, de tarde e de noite. Nós somos uma conveniência de emoções, 24 horas distribuindo máscaras e raízes.

Nós fazemos teatro de tudo, o tempo todo, porque acreditamos que a vida pode ser tão expressiva quanto a obra e que devemos ter a chance de concebê-la e fornecê-la artisticamente.

Porque estamos acordados. Porque sonhamos os nossos pesadelos.

Nós fazemos teatro apesar daqueles que, por um motivo que só pode ser estúpido, estejam "contra" o teatro. Aliás, o que pode ser "contra" algo tão "a favor"?

Nós fazemos teatro contra a mediocrização do pensamento; a desigualdade entre os iguais e a igualdade dos diferentes.

Nós fazemos teatro contra os privilégios dos assassinos de gravata, batina, jaqueta, toga, minissaia, vestido longo, farda, camiseta regata ou avental.

Contra a uniformidade, nós fazemos teatro.

Nós fazemos teatro contra o mau teatro que querem fazer da realidade.

Nós fazemos teatro para explicarmo-nos - ainda que mal - e ao mal de todos nós dar algum destino menos infeliz.

Nós fazemos teatro pra morrer de rir e pra morrer melhor.

Pra entender o inestimável, se esfregar no infalível, resvalar na nobreza, experimentar as mais sórdidas baixezas, pra brincar de Deus...

Nós fazemos teatro, comendo o pão que os diabos amassam, os pratos feitos que as produções financiam e os jantares que as permutas permitem.

Nós temos fome da fome do teatro.

Porque onde houve e há teatro, houve e há civilização.

Fazemos teatro sim, tem gente que não faz e está morrendo, essa é que é a verdade.

Fernando Bonassi

Em tempo

Bem, já tem um tempo que eu não escrevo aqui mas nunca é tarde para voltar, né?
Na verdade, eu estava de saco cheio de tudo isso, não do blog, mas de toda bandalheira que paira sobre a nossa sociedade.
Isso, em todos os níveis.
Na política.
Na cultura.
No país.
Na minha cidade.
Na (precária) condição e atenção para com o artista.

É muita revolta prum ser humano só. Todo dia meu cérebro fervilha mas isso acontece sempre em lugares onde eu praticamente não consigo escrever, apenas pensar. Caminhando na rua, dentro do ônibus, nas esquinas, sempre por aí. E basta sentar a busanfa na cadeira e não sair absolutamente nada daquilo que me dá vontade de vomitar. Por mais que eu queira, não sai. Parece quando você olha aquele doce apetitoso na geladeira, mas você só sente vontade de enfiar o dedo nele, e não de comê-lo realmente.
Acho que eu vou começar a anotar minhas idéias em algum bloco de papel que eu possa carregar no bolso ou na bolsa, pra não deixar as idéias só no sopro.
E eu já ouvi coisas do tipo "você escreve demais" ou "não atualize seu blog todos os dias" ou "guarde suas idéias para depois"... opa, perái mermão, vc tá querendo o que? ditar as regras do MEU blog? Não me lembro de ter lido nenhum manual de como cuidar do seu próprio blog.
Se não fosse pra escrever bastante, que limitassem mais o número de caracteres.
Se não fosse pra atualizar o blog todos os dias, então que criassem um sistema que bloqueia a atualização diária.
E se tudo isso existisse, talvez eu nem visse muita graça em criar um.
E ninguém é obrigado a ler o que eu escrevo e muito menos de gostar do que eu coloco aqui.
Existe a liberdade de expressão.
Existe o livre arbítrio.